Na praça, em uma pequena cidade de Goiás.

— Boa tarde, senhorita!
— Boa tarde, senhor!
— Que praça agradável, não?
— Sim, muito. Jardins bonitos e bem cuidados.
— Que belos aqueles jasmins! Mas a flor mais bela daqui é a senhorita, com todo o respeito.
— Obrigada. Meu nome é o nome de uma flor.
— Não diga! Ou melhor, diga!
— Pode ser depois? Eu não conheço o senhor, sabe?
— Mas já vai conhecer! Muito prazer! Polico Miranda.
— O prazer é meu, seu Po… perdão, eu não…
— Polico. Diferente, não?
— Qual é a origem?
— É um nome criado com exclusividade para mim.
— Foi criado a partir de quê?
— O meu pai é um homem que gosta de falar bonito. Ele é fã de Polônio, o tagarela da tragédia Ramilete
Hamlet?
— Ou isso.
— Então o seu pai é fã do tagarela do Polônio…
— Sim. E como ele também é fã de outro mestre da oratória, Odorico, caiu sobre mim um nome que combina Polônio e Odorico. O meu é bastante eloquente, E tanto é-lo, que ultrapassa as bordas da retórica, transbordando para a curvórica.
— Vejo que o senhor tem o mesmo dom palavrório do seu pai?
— Não, eu não falo palavrão!
— Palavrório quer dizer abundância de palavras (inúteis).
— Ah, sim, isso mesmo. Eu se confundi.
— Eu “me” confundi.
— A senhorita também se confundiu?
— Não. Eu quis dizer que é o pronome reflexivo correto da primeira pessoa do singular é “me”.
— Eu confesso que não sou bom nessa coisa de pronônimos. Como dizia o meu avô italiano…
— Pindasi? Não conheço.
— Não? Mas é tão famosa!
— Estranho. Nunca ouvi falar.
— Inclusível, o tirano que dominava a cidade acrescentou o seu nome ao nome da cidade.
— Como ele se chamava?
— Gaba. Monhan Gaba.
— Pindasimonhangaba… sei.
— Isso!
— O meu avô reunia os amigos em seu sítio, aos domingos, para assistir aos jogos da Internazionale de Pindasi. A minha avó fazia galinha caipira com quiabo. Era uma festa!
— Galinha caipira com quiabo? Na Itália?
— Sim. Mas a culinária da minha avó era, digamos, de outra região, famosa pela gastronomia: Imperador Paladares.
— Sei. O senhor é muito criativo. (Mentiroso!)
— Obrigado. E a senhorita parece ter uma alma tão bela quanto o corpo que a leva.
— Obrigada. O senhor é muito gentil. (E safado!)
— Mas as minhas palavras não são tão gentias com as minhas mãos… entende?
— Não.
— Não?
— Não.
— Bem, eu posso explicar com as mãos o que eu não me fiz entender com as palavras… Entende?
— Entendo.
— Bem disse Confúcio, Freud ou sei lá quem: Um ato vale mais que mil palavras.
— Misericórdia!
— Mas eu posso mesmo explicar com as mãos que as minhas mãos são mais gentias que as minhas palavras?
— Gentis, o senhor quer dizer.
— Ou isso.
— Sim, pode.
— Posso mesmo? A senhorita entendeu bem o enunciado da questão?
— Entendi. O senhor quer tocar em mim.
— Mas com todo o respeito!
— Sei.
— Então… posso tocar nos seus lábios?
— Não. Eu pensei em outro lugar.
— Uau! Vejo que pedi pouco! A colheita será maior que o plantio.
— Sem dúvida.
— Estou deverasmente emocionado! Então, que parte dessas tenras carnes receberão o toque suave dos meus dedos mágicos?
— As minhas narinas. Estão coçando. Preciso limpá-las.
— Isso não é nada romântico!
— A cada um o que merece. (Imbecil!)
— Mas que meleca!
— Exatamente isso. Adeus!

Descomplicando a Fé Cristã
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